Santa Maria, Mãe de Deus: Lc 2,16-21 - Mãe da Esperança

Por: Dom André Vital Félix da Silva, SCJ

Neste Ano Santo da Encarnação, Jubileu da Esperança, a celebração de hoje: Santa Maria, Mãe de Deus, Dia mundial da Paz, convida-nos a contemplar aquela que chamada pelo próprio Deus para ser a mãe do Seu Filho é para nós um sinal de esperança. Na bula do ano jubilar o Papa Francisco nos ensina: “A esperança encontra na Mãe de Deus, a sua testemunha mais elevada. Nela vemos como a esperança não seja um efêmero otimismo, mas dom de graça no realismo da vida. Como todas as mães, cada vez que olhava para o Filho pensava no seu futuro, e certamente no coração trazia gravadas aquelas palavras que Simeão Lhe dirigira no templo: «Este menino está aqui para queda e ressurgimento de muitos em Israel e para ser sinal de contradição; uma espada trespassará a tua alma» (Lc 2,34-35). E aos pés da cruz, enquanto via Jesus inocente sofrer e morrer, embora atravessada por terrível angústia, repetia o seu «sim», sem perder a esperança e a confiança no Senhor. Desta forma, cooperava em nosso favor no cumprimento do que dissera seu Filho ao anunciar que Ele teria de «sofrer muito e ser rejeitado pelos anciãos, pelos sumos sacerdotes e pelos doutores da Lei, e ser morto e ressuscitar depois de três dias» (Mc 8 31), e no parto daquela dor oferecida por amor, tornava-se nossa Mãe, Mãe da esperança... Nas tempestuosas vicissitudes da vida, a Mãe de Deus vem em nosso auxílio, apoia-nos e convida-nos a ter fé e a continuar a esperar” (Spes non confundit, 24).
O evangelho de hoje nos fala da peregrinação que os pastores fizeram até Belém, conforme o anjo do Senhor lhes anunciara. Certamente não foi a curiosidade que os motivou a irem à gruta de Belém, pois o nascimento de uma criança, ainda que seja um fato importante, não seria suficiente para convencê-los de obedecer a voz do Anjo, naquele momento. Mas foi a força do anúncio “Nasceu para vós o Salvador” que deu-lhes razão para deixarem tudo e tomar o caminho para Belém. Os primeiros escritores cristãos interpretaram (atualizando) a ida a Belém como o caminho que conduz à Igreja, a Casa do Pão descido do céu, onde encontraremos o Senhor envolvido em faixas e reclinado na manjedoura. Envolvido (anunciado) nas faixas das Escrituras Sagradas do Antigo Testamento que profetizaram a chegada do Messias e nas do Novo Testamento que testemunham a sua vinda, o cumprimento das promessas de Deus. A manjedoura, lugar de colocar o alimento, é o altar onde se celebra a Eucaristia, a mesa onde o Pão descido do céu chega até nós para nos dar vida em plenitude: “Quem comer deste pão viverá eternamente” (Jo 6,51). Ir até Belém é ir ao encontro do Senhor e reconhecê-lo nas Escrituras e no partir do pão (Lc 24). 
Encontrar Maria e José e o recém-nascido não é apenas constatar o que foi indicado, mas é tocar a realidade mais profunda do evangelho: Deus se fez um de nós por amor, nascendo na plenitude dos tempos de uma mulher (Gl 4,4), a aurora da salvação, sinal de esperança para toda a humanidade. 
Cada celebração da Eucaristia, memorial da Páscoa do Senhor, nos remete à cena descrita no evangelho de hoje: Deus continua a nos alimentar com a sua presença, renovando a nossa esperança e nos convidando sempre a fazermos a peregrinação até Belém (Igreja) para encontrarmos a sua Palavra envolta em faixas (Escrituras) e reclinada na manjedoura (Pão descido do céu) que Ele mesmo nos dá. 
Contudo, o encontro com o Senhor não se limita a um momento, mas se prologa no testemunho: “Todos os que ouviram os pastores ficaram maravilhados com aquilo que contavam”; e na perseverança fiel à sua Palavra: “Quanto a Maria, guardava todos esses fatos e meditava sobre eles em seu coração”; mais do que atividade intelectual ou memória afetiva, os verbos (guardar e meditar) indicam as consequências que devem ser retomadas a partir do dinâmico processo de conhecimento e interpretação dos fatos presenciados. Maria não guarda fotos num álbum, mas continua a sua peregrinação iniciada no seu sim ao Anjo Gabriel buscando sempre mais discernir a vontade de Deus na sua vida e missão como mãe do Filho de Deus, seu Menino-luz- esperança que chegou no Natal. 
Os pastores não foram apenas ver se era verdade o que o Anjo do Senhor lhes tinha dito, mas a partir do encontro com o Senhor, finalidade de sua peregrinação até Belém, “voltaram glorificando e louvando a Deus por tudo...”  O verbo voltar (grego: ‘upostrepho) tem conotação de mudança (conversão) e glorificar (grego: doxazo) mais do que cantar hinos de louvor é testemunhar concretamente os frutos da experiência da ida a Belém. Não se vai a Belém e de lá se retorna do mesmo jeito, caso contrário não é peregrinação na esperança, mas apenas deslocamento geográfico; não é encontro com o Senhor que muda o rumo da existência, mas apenas passagem efêmera nutrida apenas pela ilusão das paisagens sem tomar uma decisão profunda de fazer um verdadeiro caminho de conversão.
Que a Mãe de Deus, Mãe da Esperança nos guie neste peregrinar, iluminados pela Palavra do seu Filho e alimentados pela Eucaristia.



Dom André Vital Félix da Silva, SCJ
Bispo da Diocese de Limoeiro do Norte – CE
Mestre em Teologia Bíblica pela Pontifícia Universidade Gregoriana