Por: Dom André Vital Félix da Silva, SCJ
O Natal deste ano de 2024 se reveste de um significado particular pois inaugura o Grande Jubileu da Esperança (2025); hoje com a cerimônia de abertura realizada pelo Papa Francisco, em Roma, toda a Igreja é convidada a colocar-se como povo Peregrino de Esperança. E de forma providencial a nossa primeira peregrinação neste ano santo que se inicia se dá rumo ao presépio. Nesta noite santa do Natal do Senhor, assim como fizeram os pastores ao ouvir o anúncio do Anjo do Senhor: “Hoje, na cidade de Davi, nasceu para vós um Salvador”, também nós somos convidados a peregrinar até Belém, a fim de renovarmos a nossa esperança Naquele que nos traz a paz (1ª Leitura). O primeiro Natal, há mais de 2000 anos, foi marcado por verdadeiras peregrinações: “José subiu da cidade de Nazaré, na Galileia, até a cidade de Davi... para registrar-se com Maria, sua esposa”. Uma viagem que, aos olhos humanos, por ter sido imposta pelo poder opressor: “Cesar Augusto decretou o recenseamento de toda a terra”, a fim de ter o controle dos territórios dominados, e nada teria a ver com uma peregrinação propriamente dita, nem muito menos com as concorridas peregrinações a Jerusalém, movidas pela fé e pela alegria, nos períodos das grandes festas determinadas pela Lei.Contudo, para José e Maria irem até Belém, naquela ocasião, foi uma verdadeira peregrinação; não estavam apenas obedecendo a uma ordem do Imperador, mas realizando a vontade de Deus: “De ti Belém sairá o que governará em Israel” (Mq 5,2; IV Domingo do Advento). Característica fundamental dessa peregrinação a Belém é a esperança nas promessas de Deus, como afirmara Isabel a Maria: “Feliz aquela que acreditou, porque será cumprido o que o Senhor lhe prometeu” (Lc 1,45; IV Domingo do Advento). Em meio às trevas do poder opressor de Roma que impõe viagens penosas, partem em peregrinação José e Maria levando a Luz da qual ouvimos falar na 1ª Leitura: “O povo que andava na escuridão viu uma grande luz”. A peregrinação de José e Maria, marcada pela esperança, não foi isenta de dificuldades e obstáculos: “Maria colocou o seu filho na manjedoura, pois não havia lugar para eles na hospedaria”. Esperar em Deus não significa assumir posturas infantilizadas de quem deseja que tudo se resolva com facilidades e por toques mágicos. A esperança do crente se traduz na certeza de que a vontade de Deus sempre se realiza, independentemente dos condicionamentos externos e das vicissitudes humanas; cabe a nós colaborarmos com a sua realização, como nos convida São Paulo na Carta a Tito (2ª Leitura): “Abandonar a impiedade e as paixões mundanas e a viver neste mundo com equilíbrio, justiça e paz... dedicando-se à prática do bem”. A nossa esperança se traduz em atitudes concretas de compromisso com a construção da fraternidade entre nós; exige uma disposição de quem caminha motivado pela alegria de ser sinal de esperança para os outros não apenas transmitindo ideias bonitas, mas gestos convincentes que imprimem esperança em quem não a tem. Peregrinos da esperança também são os pastores que acolheram o evangelho anunciado pelo Anjo do Senhor (grego: euaggelizomai humiv, “eu vos evangelizo”): a boa notícia do nascimento do Salvador que é motivo de grande alegria (grego: charan megalen). A alegria não vem apenas do fato de ter nascido uma criança, o que seria bastante natural, mas porque essa criança é o Salvador, portanto, inaugura-se no primeiro natal o tempo da realização do que se aguardava na esperança. Por conseguinte, não há esperança verdadeiramente cristã se não for em vista da salvação. “Esperar que aconteçam coisas boas”, “esperar que tudo dê certo”, “esperar que não aconteça nada de mau”, “esperar que alguém nos ajude” etc. Apesar de serem desejos presentes no coração humano, nada disso tem a ver com a esperança cristã e muito menos é suficiente para que nos tornemos peregrinos de esperança. A nossa esperança está no Salvador que nasceu para nós hoje. Cremos que Ele é o Emanuel, o Deus-conosco que já no Antigo Testamento se fez peregrino com o seu povo alimentando a esperança nas suas promessas de vida em plenitude. A criança nascida hoje na gruta de Belém é o Salvador para toda a humanidade que alimenta a sua esperança Nele e se faz peregrina rumo à Jerusalém Celeste. Enquanto peregrina pelo mundo, a Igreja deve testemunhar a sua esperança, aquela que não decepciona (Rm 5,5), pois o recém-nascido, reclinado na manjedoura de braços abertos como será também pregado na cruz, é o único que pode nos fazer esperar, só Ele nos dá a certeza de que na esperança já somos salvos (cf. Rm 8,24).
Dom André Vital Félix da Silva, SCJBispo da Diocese de Limoeiro do Norte – CEMestre em Teologia Bíblica pela Pontifícia Universidade Gregoriana

Dom André Vital Félix da Silva, SCJ
Bispo da Diocese de Limoeiro do Norte – CE
Mestre em Teologia Bíblica pela Pontifícia Universidade Gregoriana