Por: Dom André Vital Félix da Silva, SCJ
Em meio a tantos fatos desastrosos e alarmantes que têm marcado o final de 2024 e início de 2025 (acidentes aéreos, terrestres, catástrofes ambientais, crimes hediondos, injustiças institucionalizadas etc.), é urgente reencontrar a estrela de Belém, aquela que nos leva até o Salvador, sem nos deixarmos enganar por outras estrelas que teimam em ocupar o céu da nossa esperança, nos arrastando para a casa dos Herodes de hoje, promotores da cultura de morte, de forma impiedosa e diabólica, verdadeiros lobos que se revestem de ovelhas e benfeitores do povo com discursos falaciosos de defesa de direitos humanos, mas que na verdade estão comprometidos apenas com os seus interesses mesquinhos e de seus pares, criando sempre mais desigualdades injustas que ameaçam e destroem a vida. Nas suas catequeses sobre o tema da Esperança, o Papa Francisco nos recorda que “Abraão, «esperando contra toda a esperança, teve fé»” (Rm 4,18). A nossa esperança não se baseia em raciocínios, previsões, nem seguranças humanas; e manifesta-se quando já não há esperança, onde não há mais nada no que esperar, exatamente como aconteceu com Abraão, diante da sua morte iminente e da esterilidade da sua esposa Sara. Aproximava-se o fim para ambos, não podiam ter filhos, e naquela situação Abraão acreditou, esperando contra toda a esperança. E isto é grandioso! A profunda esperança radica-se na fé, e precisamente por isso é capaz de ir além de toda a esperança. Sim, porque não se fundamenta na nossa palavra, mas na Palavra de Deus” (audiência 29.03.2017).A vinda dos Magos a Belém nos ensina, de maneira concreta e profunda, atitudes que expressam a esperança fundamentada na fé. “Onde está o rei dos Judeus, que acaba de nascer?” O caminho da esperança fundamentada na fé não nos torna arrogantes e vaidosos como se soubéssemos já de tudo. Mas na humildade de quem busca com confiança é fundamental deixar-se guiar pela Providência. Ainda que não sejamos isentos de nossa responsabilidade diante de nossas escolhas, Deus nos dá sempre sinais que nos ajudam a retomar o caminho, sobretudo quando esse é equivocado. Os Magos seguiram a lógica mais natural possível: onde estaria o rei recém-nascido senão no palácio real, na capital (Jerusalém)? “Herodes e toda a Jerusalém ficaram perturbados”, em contraste com atitude dos peregrinos de esperança (os magos), os poderes opressores e colaboracionistas instituídos se desesperam, pois a sua pretensa esperança não se fundamenta na certeza que vem do compromisso com a verdade e a justiça, mas nas manobras de poder humano e injusto que insistem em se manter, mesmo que isso custe a morte de inocentes.“Reunindo todos os sumos sacerdotes e os mestres da Lei, perguntava-lhes onde o Messias deveria nascer. Eles responderam: ‘Em Belém ... pois assim está escrito no profeta”. A estrela guiava os Magos, que ainda não conheciam o Salvador, nem as Escrituras. Esses eram movidos pela esperança que os fez buscar. A casa de Herodes, seus dignatários e homens da religião mesmo conhecendo as Escrituras (mestres da Lei) demonstram que não nutriam a esperança que garantia a realização da profecia. Mas, pelo contrário, tinham medo de que ela se cumprisse, o que se comprova pela perturbação ao ouvirem a pergunta dos Magos. Entre a certeza dada pela esperança de encontrarem o Messias e a “esperança” (desejo humano) que isso não fosse verdade, se sobressai a vontade de Deus que não abandona os que Nele confiam: “Ao verem de novo a estrela, os Magos se encheram de alegria”. O que nos impede de ver os astros no céu não é o desaparecimento deles, mas as nuvens que se interpõem entre nós e eles. Os Magos fazem a experiência da nuvem que encobre a estrela à medida que se aproximam do sistema dominador e de morte do pretenso rei Herodes. Assim também acontece conosco, quando olhamos demasiadamente para nossas possibilidades e capacidades humanas marcadas pelo egoísmo e injustiça, nos tornamos hóspedes de Herodes. Daí a necessidade de buscar sempre na Palavra de Deus o discernimento para nossas escolhas e decisões: “Depois de ouvirem o rei, eles partiram”, isto é, se afastaram dele, retomaram o caminho original, confirmado pela Palavra da Profecia. Muitas vezes “ouvir” (grego: akouo) na Bíblia exige pôr em prática, cumprir, porém naquilo que Herodes diz há um grande perigo: “Ide e procurai saber informações... avisai-me, para que também eu vá adorá-lo”. A tentativa de Herodes de envolver os Magos no seu plano sinistro é semelhante às manobras hodiernas de muitos grupos ideológicos, partidos políticos, inclusive grupos ditos religiosos que nos propõem parcerias apelando para causas aparentemente comuns, mas que na verdade querem apenas mais gente voluntária para a realização de seus projetos de destruição de valores humanos e cristãos. São os Herodes de hoje que se apresentam bonzinhos, solícitos, preocupados com causas nobres do bem comum, mas que alcançando os seus objetivos não têm nenhuma coerência com as promessas e compromissos assumidos. A peregrinação dos Magos, cheia de esperança, chega ao seu ponto mais alto quando: “Entraram na casa, viram o menino com Maria, sua mãe”. A cena da presença da mãe junto ao menino confirma que, de fato, o recém-nascido é o rei procurado. Na antiguidade era costume que nos momentos solenes o Rei sempre tivesse ao seu lado a sua mãe, a rainha (2Rs 24,12; Sl 44,10). Não é um pequeno detalhe, mas uma importante confirmação. Por isso os gestos subsequentes: “Ajoelharam-se diante de dele, e o adoraram. Abrindo seus cofres, ofereceram-lhe: ouro, incenso e mirra”. Os Padres da Igreja interpretaram esses dons como uma verdadeira declaração de fé: O recém-nascido é rei (ouro), é Deus (incenso) e homem (mirra). A conclusão nos aponta para um caminho que deve ser percorrido na fé pois nos faz verdadeiramente peregrinos da esperança: “Retornaram... seguindo outro caminho”.
Dom André Vital Félix da Silva, SCJBispo da Diocese de Limoeiro do Norte – CEMestre em Teologia Bíblica pela Pontifícia Universidade Gregoriana

Dom André Vital Félix da Silva, SCJ
Bispo da Diocese de Limoeiro do Norte – CE
Mestre em Teologia Bíblica pela Pontifícia Universidade Gregoriana